Brasil no Radar Global: O que todo investidor precisa saber sobre a responsabilidade do representante legal
Com US$ 68,2 bilhões em investimento estrangeiro em 12 meses, o país segue como destino estratégico, mas exige estruturação jurídica para proteger gestores e consolidar operações.
O Brasil ocupa uma posição singular no cenário internacional. Em um momento em que o fluxo global de investimentos diretos encolheu 11% em 2024, segundo a UNCTAD, o país seguiu na contramão: apenas em julho de 2025 recebeu US$ 8,3 bilhões em Investimento Direto no País (IDP). No acumulado de 12 meses, esse número alcançou expressivos US$ 68,2 bilhões, equivalentes a 3,17% do PIB.
Esse apetite demonstra a confiança dos investidores no potencial do mercado brasileiro. Mas, para quem decide atravessar fronteiras e apostar aqui, uma questão inevitavelmente surge: quais são os riscos que recaem sobre o representante legal nomeado no Brasil?
A linha tênue entre proteção e risco
O representante legal não é apenas uma formalidade exigida pela lei. Ele é a ponte entre a empresa estrangeira e a realidade brasileira: assina contratos, responde perante órgãos reguladores, abre contas bancárias e conduz trâmites que viabilizam a operação.
A legislação prevê que atos regulares de gestão não geram responsabilização automática sobre o patrimônio pessoal do representante. No entanto, em diversas áreas, a prática jurídica e a jurisprudência mostram que a linha que separa a pessoa jurídica da figura do gestor pode ser rompida, levando à execução direta contra o representante.
Riscos de execução na prática
- Âmbito trabalhista
Na esfera trabalhista, é comum a responsabilização direta do representante legal quando a empresa não cumpre obrigações com empregados. A Justiça do Trabalho adota interpretação protetiva, frequentemente estendendo a execução ao administrador quando a empresa não possui bens suficientes. Casos de penhora de salários, imóveis e veículos do representante não são incomuns, sobretudo em execuções que envolvem verbas rescisórias, FGTS e indenizações.
- Âmbito financeiro
Ao abrir ou movimentar contas bancárias, o representante legal assume, na prática, posição semelhante à de fiador. Em contratos de crédito, financiamento ou operações estruturadas, sua assinatura pode ser interpretada como garantia pessoal. A jurisprudência como diversos precedentes compilados no JusBrasil, mostra que bancos acionam bens pessoais de representantes em execuções, seja pela via contratual ou pela tese de responsabilidade solidária.
- Âmbito civil
No campo civil, a responsabilização ocorre em hipóteses de abuso da personalidade jurídica, fraude contra credores, desvio de finalidade ou confusão patrimonial. Nessas situações, o juiz pode determinar a desconsideração da personalidade jurídica e atingir diretamente o patrimônio pessoal do representante, incluindo medidas de penhora online (via BacenJud/Sisbajud), indisponibilidade de bens e bloqueio de ativos financeiros.
- Âmbito tributário e ICMS
O risco tributário é especialmente sensível no Brasil. O artigo 135 do Código Tributário Nacional estabelece que administradores podem ser responsabilizados pessoalmente. No caso do ICMS, a jurisprudência consolidada admite que o não recolhimento do imposto declarado (ICMS-ST ou ICMS próprio) pode configurar crime de apropriação indébita tributária, permitindo execução e até responsabilização penal. Diversos representantes legais já foram incluídos em execuções fiscais e tiveram bens penhorados em decorrência de débitos de ICMS.
Penhora de bens pessoais
Os efeitos práticos desses riscos se materializam na penhora de bens. O representante legal pode ter contas bancárias bloqueadas, veículos apreendidos, imóveis constritos e até salários comprometidos para satisfazer dívidas da sociedade. O uso do sistema Sisbajud (antigo BacenJud) intensificou esse cenário, tornando a constrição de ativos mais rápida e eficaz.
Governança como diferencial competitivo
Diante desse ambiente, governança e compliance são mais do que boas práticas são mecanismos de sobrevivência empresarial. Definir poderes restritos ao representante, adotar dupla assinatura em contratos financeiros, criar barreiras documentais contra confusão patrimonial e prever cláusulas de indenidade são medidas indispensáveis.
Além disso, estratégias preventivas como auditorias periódicas, controles fiscais rígidos e compliance trabalhista podem reduzir significativamente o risco de que o representante legal seja pessoalmente incluído em execuções.
O recado para quem investe
O Brasil continua sendo uma das maiores vitrines de oportunidades para investidores globais. Mas, para que essa oportunidade se converta em sucesso sustentável, é preciso compreender que o representante legal não é apenas uma exigência formal: ele é um elo sensível da estrutura societária, sujeito a riscos trabalhistas, financeiros, civis e tributários que podem atingir seu patrimônio pessoal.
Para o investidor estrangeiro, garantir que esse papel seja exercido com respaldo jurídico, limites claros e governança sólida é o caminho para blindar operações, proteger gestores e transformar riscos em oportunidades concretas.